Kurt Schwitters
“Merz é visão de mundo. Sua essência é o absoluto desprendimento, a completa imparcialidade. Nisso está baseada a criação no sentido do Merz. Em nenhum momento da produção há, para o artista, constrangimentos, preconceitos. Em cada etapa antes do acabamento a obra é, para o artista, apenas o material para o próximo estagio da criação. Nunca se almeja uma finalidade determinada além da conseqüência da criação em si. O material é determinado, tem leis, tem prescrições para o artista, a finalidade não. A conseqüência controla a produção. Determinante no julgamento da qualidade de uma obra é o grau da conseqüência alcançada na produção. Se o artista é capaz de uma conseqüência maior, então ele também tem o dever para com ela. A incapacidade não é desculpa, pois um mínimo de poder é necessário para todo o artista. Trabalhar de acordo com a conseqüência interna de seu colega chama-se imitação. Os imitadores acreditam fazer tão bem quanto o original copiado. Mas falta-lhes aquilo que apenas importa: a criatividade, a força elementar com a qual o artista original produz. O público não teme nada tanto quanto a força elementar, que ele sempre pressente. Pois a força elementar pode incomodar a tranqüilidade do público. A força elementar costuma ser presa ou aniquilada. “A força do fogo costuma ser benfazeja quando é domada, vigiada pelo homem, o poder do céu torna-se, no entanto, terrível quando se furta à corrente, fazendo acompanhar sobre os próprios passos a filha livre da natureza.” Por isso Cristo foi crucificado, Galileu torturado. O publico considera o imitador superior ao original, porque com o instinto apurado reconhece a ausência de tudo o que é elementar. Na força da recusa, na magnitude da indignação do publico o artista reconhece a força elementar da suas obras. No grau de inclinação de um grande publico a um artista, o prudente reconhece o grau de imitação nas obras desse artista. O imitador absoluto, o Kitscher, tem a maioria dos amigos no publico, em suas obras o grande publico sente-se tão familiar, tão em casa, tão entre si mesmo, ele se sente satisfeito. Em vez de matar o imitador, ele mata antes a força elementar. “Crucifiquem-no, crucifiquem-no!”. Mas é uma ilusão, pois ele pode, na verdade, matar o artista não a força. A força elementar nunca surge isoladamente, ela cresce com o tempo aqui e ali. Se matardes uma, sobrevivem ainda cem.
Merz é conseqüência. Merz significa criar relações, de preferência entre todas as coisas do mundo.
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"Jogar amarelinha com o universo. Criar relações entre todas as coisas “como se todos os pontos em que trabalhas fossem o centro do mundo” constelando novas vias, enigmas, fendas abismais, entregando-se em carne viva ao trabalho antigo de permanência na força elementar."
Patrirova
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